domingo, dezembro 23, 2018

Aquaman



Não assisti a nenhum filme anterior de James Wan, mas pela amostra de Aquaman, estamos diante de um bom diretor.


E por que não assisti?

Mesmo sendo fã de terror, a franquia Jogos mortais não me atraiu o suficiente para que eu me desse o trabalho de conferir. Talvez agora eu assista o primeiro da série, o único dirigido por James Wan.

Vamos combinar que os filmes de Wan têm um sério problema de títulos aqui em terras tupiniquins.

Senão, vejamos.

Depois de Jogos mortais (2004), vieram Gritos mortais, Sentença de morte (2007), Sobrenatural (2011), Invocação do mal (2013), suas respectivas continuações Sobrenatural 2 (2013) e Invocação do mal 2 (2016), sem esquecermos da pausa do nicho "terror" para filmar o Velozes e furiosos 7.

Convenhamos que são títulos insossos que não exercem um magnetismo inerente.

Tudo isso para (tentar) justificar minha ignorância prévia sobre o estilo de Wan.

Mas logo no começo de Aquaman, durante a luta que envolve a princesa atlante interpretada por Nicole Kidman, eu murmurei: "Este diretor é bom".

A cena foi muito bem dirigida, e as câmeras foram colocadas em pontos de vista bastante eficazes.

Ao longo do filme destacam-se confrontos marinhos e terrestres protagonizados pelo híbrido Aquaman, filho de pai humano e mãe atlante, em que o diretor James Wan pôde mostrar (em primeira mão, para espectadores desavisados como eu) seu virtuosismo atrás das câmeras.

E quanto ao roteiro deste filme da DC, tão criticada por ser menos bem-humorada que a Marvel?

Segundo consta, o relativamente novato Will Beall roteirizou a história criada por James Wan, que se considera alguém com senso de humor, realizador de filmes sombrios, mas divertidos, ou seja, temperados com cenas de alívio cômico.

Não vou dar spoiler, mas é impossível negar que Aquaman tem cenas que surpreendem pelo bom humor.

Ou seja, é um caso raro de "blockbuster" em que o diretor exerceu poder sobre o conjunto da obra, a ponto de influenciar no enredo e com certeza em outras decisões.

O filme é bastante eficaz no quesito "aventura" e "ritmo", além de trabalhar questões importantes para a humanidade hoje em dia, como a preservação da biodiversidade marinha, o combate à poluição dos oceanos, etc.

Aquaman é um herói com muito potencial a ser explorado. Que a DC continue dando autonomia a bons diretores para as inevitáveis continuações.

segunda-feira, dezembro 17, 2018

A teoria de tudo

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O filme que deu o Oscar de Melhor Ator a Eddie Redmayne é a história de um grande amor, e de como um grande amor pode ser a base de uma carreira científica brilhante.

O filme dirigido por James Marsh mostra que, sem o amor e a dedicação de Jane Hawking, Stephen não teria tido o suporte familiar para continuar estudando e produzindo. Também não teria vivido para escrever seu best-seller "Breve história do tempo". É um filme que, mais do que nunca, confirma o clichê "Por trás de um grande homem, sempre existe uma grande mulher".

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O roteiro baseia-se na obra de Jane Hawking e enfoca a relação de Stephen e Jane, em como os dois se conheceram e tiveram logo de enfrentar o diagnóstico terrível de uma doença incurável. Desde o começo, a inabalável decisão de Jane de ficar ao lado de Stephen foi essencial para que o jovem cientista pudesse continuar a vida e torná-la produtiva, apesar das dificuldades crescentes em razão da enfermidade. 
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Um dos momentos mais tocantes do filme é quando Stephen é internado em coma na França e o médico faz a Jane uma pergunta angustiante.



A Jane verdadeira, com sua simpatia contagiante e voz delicada, deu esta reveladora entrevista a uma rádio da Espanha (ela é fluente em espanhol pois fez seu Doutorado sobre Poesia Medieval Espanhola) (desnecessário dizer que não se recomenda assistir à entrevista antes de assistir ao filme, pois os entrevistadores dão spoilers):



A primeira esposa de Stephen conta nesta outra entrevista porque se decepcionou com alguns aspectos da adaptação, e de como as pessoas não devem levar ao pé da letra os detalhes de uma adaptação fílmica.


Por sua vez, o diretor James Marsh tem no currículo um Oscar de Melhor Documentário por O equilibrista (Man on Wire, 2009), que retrata as peripécias de Philippe Petit para cruzar sobre um arame estendido entre as torres gêmeas do World Trade Center em 1974.

A propósito, depois de A teoria de tudo, James Marsh emendou outro filme inspirado na vida real, Somente o mar sabe, em que Marsh volta a mostrar a capacidade de suscitar boas atuações. O diretor também repete a parceria com o compositor islandês Jóhann Jóhannsson, que veio a falecer em 2018, assim como o próprio Stephen Hawking.
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sábado, dezembro 15, 2018

Roma



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Alfonso Cuarón entrou para a história do cinema ao se tornar o primeiro cineasta a ganhar um Oscar de Melhor Diretor com um filme 3-D (Gravidade, 2013). 

O mexicano nascido em 1961 construiu um currículo curioso em que se destaca a alternância de filmes autorais e blockbusters

Roma, seu mais recente trabalho, pode ser conferido nos cinemas e por streaming. É o sinal dos novos tempos.

O filme começa com a tomada de um piso de lajotas. Todos os créditos iniciais são com essa imagem, que só muda quando água é acrescentada, e sabão, e a abertura prossegue em constantes e cada vez mais contínuas enxaguadas. A água serve também como espelho para refletir o que está acima do piso. Lá em cima, sob as nuvens claras, um avião atravessa discretamente o céu.

Assim Cuarón começa o seu filme. Sem pressa, sem badalação. E o que é mais desconcertante: sem cor. Roma é filmado em preto, branco e incontáveis tons de cinza.


Em uma análise simplista, Roma segue o ponto de vista de Cleodegaria Gutiérrez, ou apenas Cleo, a empregada doméstica que serve de amálgama a uma família de classe média, composta pelo casal, a avó, os quatros filhos e o cachorro Borras, que vive sujando a entrada da garagem.

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A rotina dessa família é desnudada sem a mínima pressa. Os personagens vão sendo apresentados e paulatinamente revelando suas facetas e idiossincrasias. Os dramas particulares de cada um vão sendo expostos.

O drama de Cleo precipita-se quando engravida do namoradinho inconsequente.

O drama da patroa é não menos complicado: o marido parece estar com a cabeça virada e decidido a abandonar a família.


O microcosmos dessa residência convencional com seus dramas convencionais torna-se algo pungente sob o olhar sensível de Cuarón.

Assim, em uma análise mais holística, o ponto de vista de Cleo serve de eixo narrativo para um retrato sociológico mais amplo, um verdadeiro romance de costumes do México do final da década de 60 e começo dos anos 1970. Havia no país uma turbulência, uma insatisfação, com manifestações de estudantes sendo abafadas com violência pelo governo.

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Em entrevista à Variety, o realizador explica as nuanças autobiográficas do filme, que é dedicado a Libo, a babá de Cuarón na vida real.

Como se trata de um filme com elementos autobiográficos, surge a pergunta: quem é Cuarón em Roma?

Resultado de imagem para roma filmeParece-me que Cuarón seria Pepe, o menino mais novo, que vive se fantasiando de astronauta e criando histórias mirabolantes junto com Cleo. Em uma cena de sabor particularmente emotivo, Cleo deita-se numa laje e encosta a cabeça à de Pepe, e os dois fingem estar mortos. Noutra Pepe ajuda a apagar um incêndio na floresta quando a família (sem o pai) está passando a virada de Ano Novo em uma fazenda.



Um perfil interessante de Cuarón pode ser conferido nesta reportagem do New York Times. A jornalista Marcela Valdes faz uma retrospectiva da trajetória do diretor e desemboca nas intimistas ideias e perspectivas de Roma.

Ao mergulhar fundo em suas memórias, Cuarón realiza um filme que tem o poder de evocar lembranças da infância, de trazer à tona momentos importantes e definidores de nossas vidas.
  




quinta-feira, dezembro 06, 2018

O alucinante olhar de Sam Raimi




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O ALUCINANTE OLHAR DE SAM RAIMI

Aproveitando a revisita ao faroeste Rápida e mortalvou republicar um apanhado da filmografia de Sam Raimi.

Uma Noite Alucinante 2 é um filmaço de terror e humor apetecível para um nicho mercadológico específico: ou seja, pessoas com um parafuso a menos, multissequenciais, não lineares – pessoas que se permitem, de vez em quando, achar graça de bobagens... 

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Não que Uma noite alucinante 2 seja um filme bobo, muito antes pelo contrário. Para mim, é seríi­ssimo. Defendo esse filme com unhas e dentes. Os movimentos vertiginosos da câmera entrando na casa mal-assombrada são até hoje copiados. O lance da mão tomando vida própria, e o pobre Ash tendo de amputá-la com a motosserra, está entre as cenas ao mesmo tempo mais dantescas e estapafúrdias da história do cinema.
Depois pesquisei e descobri que Uma noite alucinante 2 (Evil Dead II- Dead by Dawn) é, na verdade, praticamente uma refilmagem, com orçamento mais polpudo, do primeiro filme de Sam Raimi, realizado em 83: Evil Dead (que no Brasil já saiu em ví­deo, com o estúpido tí­tulo A morte do demônio). A trilogia se completaria anos depois, com o lançamento de Army of Darkness (1992), que eternizaria o anti-herói Ash (Bruce Campbell) e a mais romântica frase já proferida em um filme de terror, dita a Embeth Davidz, antes de uma cálida noite de amor: “Give some sugar, baby”
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Depois veio Darkman, vingança sem rosto (90), onde, na verdade, começou a nova onda de filmes baseados em HQ. Dos créditos iniciais aos finais, Darkman é uma aula de como adaptar banda desenhada ao cinema. Não é para menos que, uma década depois, Sam Raimi seria escolhido como o olhar por trás da câmera da série Spider Man.

Ah, sim, antes que me esqueça: entre os dois primeiros Evil Dead, ele lançou uma comédia peripatética, com roteiro dos irmãos Coen: Crimewave (Dois heróis bem trapalhões). Este filme, realizado em 1985, “disponí­vel nas melhores locadoras”, é na linha de Arizona nunca mais, com umas pitadas noir. 

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Vai analisar, a obra de Sam Raimi é supercoeren
te. Estamos em 93. Está completa a trilogia Evil Dead. Sam Raimi já esgotou a fonte, usou e reusou o ator fetiche Bruce Campbell (que faz uma ponta em Darkman como o cara que se vira no fim do filme, em Spider Man como o apresentador das lutas e em Spider Man 2 como o barrigudo porteiro do teatro). Já fez parceria com os Coen. Já expressou a paixão pelas HQs. Qual é o próximo passo? Um western, é claro!!

Rápida e mortal (The Quick & The Dead, 95) é um faroeste clássico. Estarei exagerando? Clássico é adjetivo para Casablanca. Matar ou Morrer é um faroeste clássico, dirá algum estudioso da matéria. Bem, hipérboles à parte, o fato é que Sharon Stone, no auge da carreira, escolheu o diretor que quis, no roteiro que escolheu, e o resultado foi um estouro. Um dólar nem um pouco furado. E o elenco não deixa por menos: Russel Crowe, Leonardo DiCaprio, Gene Hackman, Lance Henriksen...
Mudança sutil de estilo veio com Um plano simples (98). Aqui, Sam Raimi afasta-se um pouco da virtuosidade visual e experimenta um tom mais sóbrio, centrado na direção dos atores. Um passo simples e à frente.

Toda banda boa tem seu disco ruim. E eis que a carreira de um bom diretor tem seus deslizes. Estou falando de “For Love of the Game (99)”, comédia romântica com Kevin Costner. Aqui Raimi tipo “se vendeu” para o sistema, não foi um filme “de autoria”, definitivamente. Torci o nariz para esse filme, em protesto. Nem fui vê-lo no cinema. Acabei vendo em ví­deo, na casa de minha mãe, e olha: é até bem bonzinho.

O bom filho à casa torna: Sam Raimi voltou ao suspense com The Gift (O dom da premonição, 2000). Porém, o tom aqui é outro. Puxando para o “suspense psicológico”, levando-se completamente a sério. O roteiro chafurda no pântano dos lugares-comuns, e o que podia ser uma volta aos velhos tempos, deixou um pouco a desejar. Sam Raimi parecia preocupado em mostrar que pode ser um diretor de filmes “sérios”. 


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A fantasia e a aventura são, sem dúvida, a sua praia. Tudo o que Sam Raimi aprendeu, desde a fase trash-escatológica de Evil Dead até o sisudo Um plano simples, a alucinante capacidade de inventar tomadas e movimentos de câmera, adicionada à maturidade na direção dos atores, desembocou de forma cristalina na série Spider Man. Ninguém chega aonde chega ao acaso. O talento e o treinamento são essenciais. A série Spider Man está aí para provar. Alguém discorda? 


Depois da série Homem-Aranha, Sam Raimi realizou apenas dois filmes: Drag Me to Hell (2009) e Oz - mágico e poderoso (2013), seu único filme 3-D.



Rápida e mortal

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Após rever Rápida e mortal em companhia de meu filho de 11 anos, eu tive de me olhar no espelho e me fazer uma pergunta séria:

"Por que cargas d'água o diretor Sam Raimi aos poucos foi saindo da lista de meus Top Ten?".

É difícil encarar a realidade: não há nenhum motivo técnico tampouco emotivo para que isso tenha acontecido.







A única explicação plausível que eu encontro é que a minha empolgação pelo trabalho de Raimi talvez tenha arrefecido na mesma proporção que a volúpia dele por fazer filmes foi diminuindo.

Na última década (2009-2018) ele só realizou dois longa-metragens: Drag me to Hell e Oz.


A verdade é que, filme por filme, Raimi nunca me decepcionou.



Talvez ainda falte a Sam Raimi uma incursão no drama que o afaste um pouco dos subgêneros aos quais ele é geralmente relacionado.



Mas ele não nega as origens: notícias circulam que seu próximo projeto na direção será um filme sobre o Triângulo das Bermudas.

Agora, vamos ao que interessa.


Rápida e mortal (1995) é um faroeste moderno com personagens fortes e elenco carismático.

Sharon Stone tira uma lasquinha de Leonardo DiCaprio e abusa de Russel Crowe.

Aos 21 anos DiCaprio prova que um pirralho ainda pode ser incrivelmente charmoso.

Crowe estreia em Hollywood contracenando com a musa Stone.




Gene Hackman não deixa por menos e encarna o prefeito carrasco com autoridade.

Sam Raimi talvez já desconfiasse de que no futuro o seu elenco acabaria com nada menos que três Oscars de Melhor Ator.

Gene Hackman já tinha o dele por Operação França.

Russel Crowe abiscoitou o seu em 2001 com Gladiador.

Por fim, mas não menos importante, DiCaprio enfim arrebanhou o dele em 2016 com O regresso.

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O elenco "coadjuvante" tem ainda o ótimo Lance Henriksen, o Bishop de Aliens e Alien 3.
Nesta entrevista o ator fala sobre as gravações de The Quick and the Dead e do dia em que teve a ousadia de dizer a Gene Hackman como fazer uma cena.

Esses detalhes dão uma ideia da força do elenco reunido para esse western despojado e rápido.

Com atuações memoráveis e a direção sempre inovadora de Raimi, Rápida e mortal é diversão pura.

Com amor, Van Gogh

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Loving Vincent é o modo carinhoso com que Vincent Van Gogh subscrevia as cartas endereçadas ao irmão Theo.

Também é o título deste filme que surpreendeu o mundo em 2017




Na animação dos diretores Dorota  Kobiela e Hugh Welchman, nitidamente a forma prevalece sobre o conteúdo. Mais de cem pintores colaboraram na tarefa hercúlea de colorir a óleo cada fotograma do filme.Resultado de imagem para loving vincent photos

A experiência de assistir ao filme é meio hipnótica, e o espectador tem muitas vezes a sensação de estar dentro de um quadro de Van Gogh. 

A história acompanha a saga de Armand Roulin, filho do carteiro, para entregar a última carta escrita por Van Gogh.
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O personagem foi retratado por Van Gogh em 1888 com um casaco amarelo que é usado no filme também.


A jornada de Roulin serve de catarse para alguém que se sente meio culpado pela morte do amigo. Afinal de contas, quando há um suicídio, todas as pessoas que têm amizade com a pessoa podem experimentar uma sensação parecida e pensar: "Será que eu não podia ter feito algo para evitar ou tentar evitar que o pior acontecesse?".Resultado de imagem para loving vincent movie

O rapaz começa a investigar os acontecimentos do suposto suicídio e descobre que talvez a explicação seja outra, envolvendo a ação de jovens da localidade que maltratavam o pintor.

Um deles, René Secrétan, tinha uma arma, e corriam boatos à boca pequena que o jovem poderia ter sido o autor do disparo.

Uma biografia de 2012 e um filme de 2018 de Julian Schnabel endossam essa possibilidade.

É uma dessas questões que ficarão insolúveis até o fim dos tempos.



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segunda-feira, novembro 26, 2018

Five Came Back

Caótico documentário em três episódios sobre o trabalho de 5 cineastas estadunidenses na Segunda Guerra Mundial.

Um deles, William Wyler, voltou da guerra com a audição seriamente abalada e pensou inclusive em se aposentar.

A trepidante história contada por Mark Harris em seu livro homônimo transforma-se num caleidoscópio de entrevistas, colagens, trechos dos filmes, tudo costurado pela premiada narração de Meryl Streep.

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O diretor da "série documental", o francês Laurent Bouzereau, é um homem da confiança de Steven Spielberg. É o responsável por registrar os bastidores dos filmes, entrevistar o elenco, etc., para transformar nos extras. Um exemplo é a edição comemorativa dos 4 filmes de Indiana Jones, cuja direção dos extras é assinada por Bouzereau. Ele também realizou em 2017 Steven Spielberg & John Williams: The Adventure Continues.

Five Came Back (poster).jpg

Bouzereau era, portanto, o sujeito com as credenciais certas para juntar todo esse rico material e transformar numa série muito interessante, mas não por isso menos caótica.

A ideia de cada diretor antigo ser "apresentado" por um diretor atual é uma das grandes sacadas do documentário. Steven Spielberg, Guillermo Del Toro, Paul Greengrass, Francis Ford Coppola e Lawrence Kasdan contribuem com suas observações para moldar o formato caótico do documentário. O que eu chamo de caótico, Inácio Araújo considerou "irritante" em sua crítica para a Folha de São Paulo. Ele achou desnecessárias as intervenções desses cineastas contemporâneos.
Concordo com ele que as intervenções são desnecessárias para contar a história. Mas em termos de marketing e para "fazer a ponte" entre gerações, foi uma boa ideia. 


Em termos estruturais, o primeiro episódio introduz e contextualiza, o seu segundo episódio traz a parte mais sombria, um retrato de tudo que aconteceu de errado na empreitada de cada um desses diretores, e o terceiro arremata com um quê de otimismo.

Esta reportagem do Independent elogia o serviço de streaming responsável pelo documentário, que também disponibilizou na íntegra os curtas realizados durante a Segunda Guerra Mundial por esses cinco grandes cineastas, dos quais Thunderbolt já foi resenhado aqui. 
O Independent conclui: "Netflix is at its best when it challenges its subscribers, rather than simply spinning out tried-and-tested binge fodder".



Assistir ao três episódios do documentário ajuda a entender como a experiência no front deixou marcas profundas na psique de cada um dos diretores e influenciou o trabalho deles no pós-guerra. Um fato curioso e relevante é que justamente no rescaldo da guerra eles fizeram algumas de suas obras-primas:

William Wyler ==> Os melhores anos de nossas vidas (1946).

John Huston ==> O tesouro de Sierra Madre (1948)

Frank Capra ==> A felicidade não se compra (1946)

George Stevens ==> Um lugar ao sol (1951)

John Ford ==> Rastros de ódio (1956)


 Para abrir horizontes e aprender mais sobre a Segunda Guerra Mundial e Hollywood, Five Came Back é uma imperdível aventura.

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sábado, novembro 24, 2018

Psicose (1960)


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Do livro "Alfred Hitchcock, o mestre do medo" de Inácio Araújo: "Com Psicose Hitch reafirmou mais do que nunca sua marca de "senhor do medo", a maestria em manipular as emoções do público e o talento para a autopromoção".

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Do livro Hitchcock by Truffaut

"François Truffaut: Você diria que Psicose é um filme experimental?

Alfred Hitchcock: Possivelmente. Minha principal satisfação é que o filme exerceu um efeito sobre as plateias, e eu considero isso importantíssimo. Não me importo com o tema. Não me importo com a atuação; mas realmente me importo com os trechos do filme e a fotografia e a trilha sonora e todos os ingredientes técnicos que fazem a plateia gritar."

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Do livro "Afinal, quem faz os filmes", de Peter Bogdanovich (tradução de Henrique Leão):

"Em Psicose, na verdade você dirige o público, mais do que os atores."

"Sim. É o uso do cinema puro, para transmitir emoções à plateia. O filme foi realizado com recursos visuais elaborados de todas as formas possíveis, tendo em vista o público."
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Do livro "Alfred Hitchcock", de Bill Krohn, da coleção Masters of Cinema da Cahiers du Cinema: 

"Pequenas experimentações ajudaram a moldar este filme cruelmente belo, em que a televisão torna-se cinema e a vida cotidiana torna-se uma visão fantástica inspirada em Poe: Psicose deu origem a outro gênero imensamente lucrativo: os filmes slasher."







Do livro "Great Film Directors", de Andy Tuohy e Matt Glasby: "Hitch alcançou uma sequência de brilho tão singular que foi cunhado o adjetivo hitchcockiano. Antigamente o mais elevado elogio cinematográfico, hoje é apenas um lembrete de um legado que paira sobre a história do cinema como aquela silhueta."

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Da obra A magia do cinema, de Roger Ebert (tradução de Miguel Cown):

" O que faz de Psicose um filme imortal, ao contrário de tantos filmes cuja metade esquecemos assim que deixamos o cinema, é que ele se conecta diretamente com os nossos medos."

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Do livro "Dicionário de cinema: os diretores", de Jean Tulard (L&PM, tradução de Moacyr Gomes Jr.):

"François Truffaut explicará, em Le cinema selon Hitchcock, as razões de um tal fascínio: 'Sua obra é ao mesmo tempo comercial e experimental, universal como Ben-Hur de William Wyler e confidencial como Fireworks de Kenneth Anger'."

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Do livro "1001 filmes para ver antes de morrer" (tradução de Carlos Irineu da Costa, Fabiano Morais e Lívia Almeida) : "A reação do público foi assombrosa, com pessoas formando filas que davam volta no quarteirão para garantir seu ingresso. Mais falatório ainda foi gerado pela nova 'política especial' de Hitchcock de não permitir a entrada no cinema depois dos créditos iniciais de Psicose. Claramente, o diretor britânico havia encontrado uma forma de cutucar diretamente a psique coletiva dos norte-americanos."

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Do guia Videohound's Golden Movie Retriever: (classificação: Four bones = Masterful cinematic expression.) "Hitchcock apostou em sua estatura diretorial e quebrou todas as regras nesta história (...). Filmado com orçamento limitado em pouco mais de um mês, Psicose mudou os filmes de horror de Hollywood para sempre."

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Do Variety Movie Guide: "Hitchcock embalou Psicose em gore, na forma de dois esfaqueamentos representados graficamente, uma história repleta de motivações freudianas, e salpicou aqui e ali no enredo pitadas de humor que sugerem que a coisa toda não deve ser levada a sério." 

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sexta-feira, novembro 23, 2018

Deixe-me entrar



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Para quem já viu Deixa ela entrar, é estranho assistir a esta refilmagem. O filme é praticamente o mesmo, com o roteiro vertido ao inglês, elenco ianque e tudo o mais que a indústria hollywoodiana pode proporcionar. 

Sai a musicalidade do idioma sueco e entra a familiaridade com a língua inglesa. O filme perde em sonoridade, mas ganha em visibilidade.

Afinal de contas, tente encontrar o original sueco para assistir ou comprar. Terá muito trabalho.
O filme de Matt Reeves é mais facilmente encontrável e inclusive disponível no... você já sabe onde.

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O elenco de Deixe-me entrar não perde para o do original; as crianças foram muito bem selecionadas e hoje estão estrelando em vários filmes novos.

O australiano Kodi Smit-McPhee (recentemente visto em Alfa) é Owen, o menino introspectivo que sofre bullying na escola, e Chloë Grace Moretz é Abby, a misteriosa garota forasteira que anda de pés descalços, comporta-se de modo incomum e guarda um segredo mortal.

Outras diferenças/similaridades podem ser conferidas neste artigo de um modo mais bem-humorado e neste outro sob um prisma mais sério.


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A pergunta que não quer calar: 
vale a pena conferir Deixe-me entrar?

Sim. Caso você ainda não tenha visto o filme do sueco Tomas Alfredson, este servirá como substituto quase à altura.

Caso você já tenha tido o prazer de ver o original, vale a pena, sim, ver uma outra versão da mesma história. A refilmagem é honesta e respeitosa, mantendo o "clima" do filme sueco e despertando semelhantes sensações.





quinta-feira, novembro 22, 2018

Jack Whitehall: Travels with my Father

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Eu não tinha ideia de quem era "Jack Whitehall" ao selecionar esta "série documental" no mais famigerado serviço de streaming digital em operação no Brasil.

Quero esclarecer que só estou "degustando" essa plataforma e conhecendo seus prós e contras porque um irmão me disponibilizou essa possibilidade sem que eu precisasse gastar um centavo sequer. Obrigado, mano!

Com o sangue assim adocicado, sem precisar "desembolsar", fica fácil de criticar, não é mesmo?



Eis que incluí este seriado na "Minha lista" por instinto, talvez pelo título inusitado, talvez pelo meu interesse em conhecer lugares novos sem precisar viajar.

E a surpresa foi acachapantemente positiva.

Os episódios são curtos, perpassam um humor cada vez mais raro nos dias de hoje (um humor essencialmente britânico, que manda às favas o politicamente correto) e, ao mesmo tempo, mostram a cultura de diferentes países e a dificuldade (e riqueza de nuances) de um relacionamento entre pai e filho.

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Morar no interior tem lá suas vantagens. O tempo que você passaria no trânsito numa cidade grande é o tempo que sobra para assistir a esses breves drops de humor, cultura e geografia.


Uma amostra do tipo de humor que permeia o show pode ser encontrado neste vídeo protagonizado por Jack Whitehall e Michael, seu septuagenário pai. 

Já terminei as duas temporadas disponíveis e descobri nesta reportagem que existe a possibilidade de uma terceira temporada, apesar da agenda cada vez mais lotada dos dois protagonistas. 

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A propósito, em um dos episódios da segunda temporada revisitei a Moldávia, que eu já conhecia do álbum de Tintim, O cetro de Otokar, entre outros. Hergé inclusive criou um país fictício, a Sildávia, híbrido de Transilvânia (região da Romênia) e Moldávia.

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E assim fiquei conhecendo por intermédio de Jack Whitehall talvez uma das bandas mais esquisitas da face da Terra, com a bizarra formação de vocalista, violinista elétrico e saxofonista: o Sunstroke Project.

Vem da Moldávia a trilha sonora ideal para este estranho post:





quarta-feira, novembro 21, 2018

Os Intocáveis

Resultado de imagem para untouchablesO filme realizado por Brian De Palma e que estreou nos EUA em 3 de junho de 1987 é uma aula de cinema.
Em primeiro lugar, o roteiro do dramaturgo David Mamet (autor de Três usos da faca), baseado no livro homônimo, de Oscar Fraley e Eliot Ness. É um script fabuloso, com cenas bem urdidas, diálogos bem costurados, sequências que ficam na retina. Ação, emoção e inspiração transbordam nas páginas do roteiro, que pode ser baixado aqui.
Mamet recentemente participou de uma exibição comemorativa do filme e respondeu a algumas perguntas da plateia. As espirituosas respostas podem ser conferidas neste artigo.
Não é demais bater na tecla. A quantidade de cenas memoráveis deste filme é absurda.
Vou citar apenas uma: a escolha do recruta Stone.




A cena envolve três atores: Kevin Costner, Sean Connery (no papel que lhe rendeu o Oscar de Ator Coadjuvante) e um novato chamado Andy Garcia.
A maneira que Malone, personagem de Connery, "entrevista" Stone, o virtuose atirador, é simplesmente um dos momentos mais empolgantes do cinema de todos os tempos.

E esse é só um exemplo de uma lista que seria infindável e repleta de spoilers.
Não poderia deixar de citar a celebérrima cena da escadaria, uma homenagem a Eisenstein.









Em segundo lugar, a trilha sonora de Enio Morricone. Perfeição é o mínimo para descrever a precisão e a categoria dos movimentos musicais ao longo do filme.

A edição do filme, assinada por Gerald Greenberg (Oscar por Operação França) e Bill Pankow, contribui sobremaneira para o suspense que impregna cada fotograma do filmaço de Brian De Palma. Existe no You Tube uma análise útil sobre a montagem de algumas cenas, em especial, a clássica cena da escadaria. Recomendo só assistir à análise após assistir ao filme.





A direção? Bem, as tomadas feitas por De Palma são proverbiais, em cada cena ele puxa um coelho da cartola e surpreende o espectador com o ângulo de observação, sem esquecer as tomadas clássicas de girar a câmera durante uma conversa de quatro amigos (os Intocáveis) na mesa do bar.

Chegou o momento de falar no elenco. Já citei os principais nomes. O quarto componente do grupo de elite do Ministério do Tesouro é Charles Martin Smith, que interpreta o contador Oscar Wallace. Junto com Elliot Ness (Kevin Costner), Jim Malone (Connery) e George Stone (Andy Garcia), formam o grupo conhecido como Intocáveis para combater a perigosa organização chefiada por ninguém menos que Al Capone (Robert De Niro).

Acrescente a tudo isso o guarda-roupa de Armani e outros detalhes bem cuidados e bingo!
Os Intocáveis é uma aula de cinema.

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