quinta-feira, janeiro 11, 2018

O importante é amar


Conforme prometido, dei uma nova chance ao diretor de origem polaca nascido na Ucrânia Andrzej Żuławski. Ou seria melhor afirmar: dei a mim mesmo uma nova chance de conhecer de verdade a obra desse controvertido diretor.

Escolhi um filme dele anterior a Possessão, o filme que me provocou uma intensa repulsa anos atrás. A propósito, quando terei coragem de rever Possessão? Talvez nos próximos dias. Talvez até o fim de 2018. Talvez só depois de obter um panorama da obra de Andrzej Żuławski. O tempo dirá. Seja como for, já sei também o motivo de toda aquela rejeição.


Andrzej Żuławski é o diretor antipossessivo por excelência. Em seus filmes, todo e qualquer sentimento de ciúme e possessividade é ridicularizado sem dó nem piedade. Disso resulta que uma categoria importante de personagens zulawskianos sejam maridos patéticos, peripatéticos. Vide o personagem de Sam Neill em Possessão e o Jacques Chevalier de O importante é amar (Jacques Dutronc, em uma atuação memorável).


O importante é amar, filme realizado por Andrzej Zulawski em 1975, em última análise é um estudo de personagens que poderia ser rotulado de "triângulo amoroso". Algo não muito diferente do que ele realizaria em Possessão (1981). Com um talento acachapante para criar personagens femininas ambíguas e misteriosas, Zulawski cria em seus filmes as condições ideais para aflorar o talento das atrizes. Neste filme brilha Romy Schneider, como Nadine Chevalier, a atriz de filmes pornôs que é um dos vértices deste bizarro triângulo amoroso.


Na segunda ponta está Jacques Dutronc, que interpreta Jacques, o engraçado marido de Nadine. Sob todos os prismas, as atitudes de Jacques são pautadas por um intenso amor por Nadine, e, ao mesmo tempo, um reconhecimento da incapacidade de satisfazê-la, ou de entendê-la, ou de ser suficiente para ela. O marido de Nadine protagoniza cenas bizarras em todo o filme, entre elas, uma cena em que ele prepara café, e aparece um grande frasco de Nescafé, e outra em que ele imita Napoleão.

Na terceira ponta está outra alma desolada, Servais Mont, interpretado pelo italiano Fabio Testi, fotógrafo e cinegrafista de filmes pornôs que (na minha leitura) se apaixona perdidamente por Nadine, mas não consegue lidar com isso, com o fato de ela ser casada. Klaus Kinski tem seu momento no filme como o ator shakespeariano que não aceita críticas negativas. 



Sem quase nunca tirar a jaqueta verde ao longo do filme, Servais resolve interceder ao pegar dinheiro emprestado para financiar uma peça teatral, desde que Nadine seja a estrela e que ela não saiba sobre a sua intervenção. O personagem oscila ao longo da história entre o pudor de estragar um casamento, a vontade de ficar com Nadine e a dependência financeira de um despudorado curador de filmes eróticos, que não aceita a decisão de Servais de se afastar das filmagens.

Nesse meio-tempo, Zulawski move sua câmera pelos cenários e nos retrata o curioso e avassalador entrelaçamento do destino desses personagens. O principal ambiente é a sala transformada em quarto pelo casal Chevalier, forrada de pôsteres de filmes, como East of Eden (Vidas amargas, com James Dean) e Le Fils de Zorro. O site Films in Films traz uma lista de todos os pôsteres expostos na mencionada sala.
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É muito fácil se viciar neste filme, basta terminar de assisti-lo que já dá vontade de recomeçar a revê-lo, nem que seja para tentar ampliar as interpretações sobre os atos de cada um.

Mas é justamente isto que torna tão especial O importante é amar: Andrzej Żuławski não julga ninguém, não quer defender nenhum ponto de vista, apenas mostrar a angústia de ser humano, demasiadamente humano.

Sentimentos contraditórios são expostos e decupados, atitudes incompreensíveis são retratadas sem necessidade de explicar nada, afinal, a vida é como ela é, existem pessoas imprevisíveis, pessoas que podem ser rotuladas de "loucas" por sua inconstância, volubilidade e ambiguidade.

Por isso que o cinema de Andrzej Żuławski não é facilmente deglutível para quem espera um posicionamento prévio, um preconceito, um ato falho.

Como bônus do post, uma coleção dos pôsteres deste filme incongruentemente desconcertante... ou seria desconcertantemente incongruente?









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